Objetivo

O blog visa compartilhar registros das aulas (anotações, fotos, vídeos) comentários críticos sobre os procedimentos vivenciados, acrescentar textos teóricos, poéticos, sugestão de links, músicas. São 15 tópicos, referente as cada uma das aulas ministradas entre março e junho de 2010. Em agosto de 2010 serão publicados artigos hipertextuais produzidos por cada um dos alunos que focam princípios e procedimentos de encenação.



Encenador-Pedagogo - Procedimentos Práticos no trabalho do ator


O Encenador-Pedagogo:
Procedimentos Metodológicos no trabalho do Ator - Primeiras Investigações

por Péricles Martins

"Artista e professor não são profissões antagônicas. Logo uma não nega a outra; também não são sinônimos , como defendem os que acreditam que qualquer um pode ser artista, assim como qualquer um pode ser professor. Segunda essa crença, ser artista e ser professor independem de formação específica. Tais funções, na verdade, podem ser complementares."
Márcia Strazzacappa (pesquisadora e arte educadora)



Ao longo dos anos, a arte da direção vem passando por diversas transformações. No Dicionário de Teatro do Patrice Pavis, encontramos duas definições. A primeira delas é o Diretor de teatro: “figura de diretor de teatro, administrador, que contribui grandemente não só para a gestão, mas também para a estética dos espetáculos”. (1999, p.100). A segunda é o Encenador: “Pessoa encarregada de montar uma peça, assumindo a responsabilidade estética e organizacional do espetáculo, escolhendo os atores, interpretando o texto, utilizando as possibilidades cênicas à sua disposição” (1999, p. 128).
Jean Jacques Roubine, em seu livro “A Linguagem da Encenação Teatral” – considera André Antoine, como o primeiro encenador – pois tal nome constitui a primeira assinatura que a história do espetáculo teatral registrou e também o primeiro a sistematizar suas concepções, e teorizar a arte da encenação.
Depois de Antoine, surgiram outros encenadores que teorizaram/registraram suas práticas e tornaram referências fundamentais para o teatro moderno, entre eles: Konstantin Staniskavski, Vsevolod Meyerhold, Erwin Piscator, Bertolt Brecht, Antonin Artaud, Jerzy Grotowski, Anatoli Vassiliev, Eugênio Barba, entre tantos outros. Há de considerar que outros encenadores como: Pina Bausch, Robert Wilson, Antunes Filho, Peter Brook, Gerald Thomas, José Celso Martinez Côrrea, Tadeusz Kantor – assumem mesmo que indiretamente a função de encenador-pedagogo. Fica evidente quando nos deparamos com alguns roteiros cênicos ou exercícios técnicos para o ator - desenvolvidos por estes encenadores/diretores que veremos adiante.

No Brasil, na década de 60, caracterizou-se como o período de diversas propostas e resultados de ruptura com parâmetros até então vigentes da linguagem cênica, como por exemplo o Teatro de Arena de São Paulo e o Teatro Oficina. Augusto Boal, quando voltou dos Estados Unidos após dois anos estudando teatro na Columbia University em New York foi convidado pelo diretor José Renato a dirigir o Teatro de Arena de São Paulo. Seus propósitos nesta época, eram os que até hoje regem seus trabalhos: Desenvolver uma dramaturgia brasileira, descobrir um estilo brasileiro de interpretação, usando o processo de Stanislavski. Já o Teatro Oficina, dirigido por José Celso Martinez Corrêa:

".... é totalmente voltada para captar os novos sinais dos possíveis utópicos que barram o caminho das renúncias realistas dos derrotados. Desde o começo, o seu trabalho é uma paciente decifração desse novo alfabeto. Não renuncia a exigir do aqui-agora uma saída outra que a já previsível, e portanto, já morta, pois decorrente da escolha de uma classe que domina, sem nunca representar a humanidade dominada. A condição desta busca incansável está na sua capacidade de viver pronto a romper com a ordem pré estabelecida das coisas. Buscar um novo mundo possível é, antes de tudo, trair o em que vivemos; é recusar os valores de uma classe que se reproduz para mantê-lo sempre igual. 
(Stall, Ana Helena Camargo de – Primeiro Ato).

Existem poucos estudos e escritos práticos emergentes sobre o trabalho do ator contemporâneo, âmago da atividade dramática teatral, que vêm se desenvolvendo de forma arrojada pelos especialistas profissionais brasileiros, é dever urgente dos Departamentos de Arte de nossas Universidades, sabedores que somos da importância vital desse conteúdo ser irradiado para os diversos segmentos.
A bibliografia sobre procedimentos metodológicos sobre o trabalho do ator brasileiro é ainda muito escassa. Não temos acesso ao trabalho realizado por diretores-pedagogos que investigam com profundidade as questões relacionadas à prática do ator brasileiro, atuando fora ou dentro das escolas de arte dramática. Refiro-me não somente à possibilidade de acesso a uma bibliografia específica mas, fundamentalmente, à investigação ATUAL e RECENTE realizada por pesquisadores-práticos, reforçando a necessidade do registro vivo de suas práticas.

Muitos desses pesquisadores desenvolvem procedimentos metodológicos de trabalho para o ator, seja pela prática de treinamentos, pesquisa de linguagens específicas, realização de espetáculos ou por outras formas práticas de descoberta de soluções para os problemas do fazer teatral.

Contudo, a sistematização de tais atividades não é comumente realizada, uma vez que os artistas costumam desenvolver suas descobertas em isolamento, não realizando também a compilação necessária desses conhecimentos. Tal isolamento conduz, naturalmente, à ausência de discussão e possível estagnação, criticadas, muitas vezes, pelos próprios estudiosos e autores.

O registro dessas técnicas é fundamental, por se tratarem de propostas atuais, cujas transformações encontram-se ainda em curso. Se tal registro não for realizado de imediato e durante a experiência viva, não teremos a dimensão exata do desenvolvimento dos seus procedimentos, encontraremo-nos, mais uma vez, limitados aos fragmentos de técnicas e processos que normalmente nos são colocados à disposição.

A essência do teatro é o ator. As relações com os outros elementos, cenário, figurino, música, etc., ocorrem a partir da investigação do trabalho do ator. O caminho do ator é um caminho de ações, dos exercícios. Quais são esses exercícios? Quais as estratégias desses exercícios? Quais os eixos básicos? Os exercícios são sempre específicos, dentro de cada didática. E o caminho de qualquer processo pedagógico ocorre através da ação. Investigar metodologias de prática de ator significa estudar quais as ações de treinamento e criação envolvidas nas mesmas. Somente com a consciência dos procedimentos metodológicos podemos depurar e acelerar processos e, por meio das trocas, verticalizar o conhecimento do ofício dramático.

Luis Carlos Garrocho escreve sobre a perspectiva pós-dramática:

“.......Na perspectiva pós-dramática e performativa, não existe regras que poderiam levar a um aprendizado também de ordem geral. Cada ‘processo de criação possui ou inventa as suas próprias regras’, já que cada obra se inventa no seu percurso e nas interações vividas. Desse modo, cada técnica pressupõe sua linguagem e seu próprio contexto. Algumas estratégias pedagógicas podem ser listadas. Em primeiro lugar, o trabalho corporal pode ser enfatizado visando processos de troca entre parceiros, apropriação do movimento e da capacidade improvisacional. Nessa direção, importa muito mais a presença, a capacidade de afetar e de ser afetado pelos outros, pelo entorno e interações. Esse plano deve ser antes de tudo ‘cartográfico’, isto é, compor com heterogeneidades: uso de vídeo, sonoridades, objetos criados ou encontrados, figurinos, além da possível relação com os corpos não treinados etc. Práticas de intervenção e ocupação de espaços existentes, não destinados à apresentação artística, devem ser encorajadas e, inclusive, com aspectos de pesquisa social, antropológica etc. Deve ser lembrando, ainda, que uma prática desse tipo exige leituras e interações afins: vídeos, poemas, espetáculos, ensaios abertos, entrevistas com performadores e coletivos de criação, estudos de campo em caráter performático etc. Assim, as criações dos alunos e alunas encontrariam seus possíveis intercessores e estabeleceriam ressonâncias com a produção artística contemporânea”.

A seguir, segue procedimento prático desenvolvido por Tadeusz Kantor - para o espetáculo "A Classe Morta" 

Procedimento: Roteiro Cênico

Uma sala de aula (o espaço)

Surgido do fundo da nossa memória, em alguma parte, em um canto distante. Algumas fileiras de pobres bancos escolares de madeira. Livros secos que se desfazem em pó. Em dois cantos, a recordação de castigos recebidos há muito e de figuras geométricas desenhadas com giz no quadro negro. O banheiro da escola onde se fez a aprendizagem das primeiras liberdades.Os alunos, velhos desvairados à beira da queda, e os ausentes... levantam a mão em um gesto de todos conhecido e ficam assim imóveis, pedindo algo. Um último algo. Saem... a classe se esvazia. E de repente todos voltam...
Começa, então, o último jogo da ilusão...A grande entrada dos atores... Todos levam crianças pequenas (bonecos) como pequenos cadáveres... alguns bonecos balançam inertes, outros aferrados em um movimento desesperado, suspendidos, arrastando-se como se fossem o remorso da consciência, amarrados aos pés dos atores... criaturas humanas que exibem sem vergonha os segredos do passado... com as excrescências de sua própria infância.

1ª Parte

Ilusão
Orações mudas! Dedos.
Saída súbita.
Grande entrada.
Desfile.
Infância morta.
Regresso dos despojos.
Lição sobre Salomão.
As últimas ilusões. Grandes brindes.
Lição noturna.
Passeios noturnos do velho da bicicleta com criança.
Prostituta sonâmbula.
Velho do W.C.
Mulher em uma janela.
Alucinações históricas.
Soldado da primeira guerra mundial.
Deveres fonéticos.
Fazer trejeitos, macaquices.
Sinos, parada.
Entrada da mulher de limpeza.
Zelador como um pretérito perfeito.
Voz.
Foge da mulher da limpeza.
Máquina familiar.
Berço mecânico.
Grande limpeza da primavera.
Ensaio de uma morte no circo.
Os acontecimentos importantes se perdem nos sonhos em curso.
Lição sobre Prometeu.
Incidente com um salto.                                                    
Declinação de dedos.
Aparência de êxito.
Assassino secreto no banho.
Explicações complicadas.
Queixas escolares.
Mulher em uma janela.
Excursão de primavera.

2ª Parte

Enterro com grande pompa.
Dias das almas prolongado ao máximo.
Orgia.
Orgia simultânea.
Robson Colonial da guerra histórica.
Mulher em uma janela.
Ensaio da última corrida.

3ª Parte
Canção de berço.
Diálogo mudo.
Conserto de um cadáver.
Ação extravagante da mulher do berço.
Comportamento chocante do velho do banho.
O velho aturdido da bicicleta do menino vai em sua bicicleta saudando a todos, desde então, seguirá saudando na bicicleta e saudando.
Adulações repugnantes.
O velho surdo. Traz notícias assombrosas!
Infinidade, limpeza das orelhas, corrida injustificada do velho surdo que, desde então, seguirá correndo sem fim e sem objetivo.

Dois cadáveres nus, vítimas do velho dos banhos dão um ataque de apoplexia, o velho dos banhos cai morto em companhia de seu camarada defunto e seguem caindo e levantando eternamente, um por vez.
O consertador do cadáver continua.
Cortejo fúnebre do soldado da primeira guerra mundial.
Vacilação da mulher do berço.
Desde então, repetirão alternadamente, seus gestos cada vez mais vazios e insensatos.
Desaparecimento despercebido da morte/mulher da limpeza, da prostituta sonâmbula.
Os velhos jogam cartas.
Seguirão jogando por toda a eternidade, o zelador entra na eternidade com seu hino nacional austríaco.

O teatro dos autômatos continua: todos repetem os gestos interrompidos que não terminarão jamais.
A mulher da janela segue olhando fixamente.

1.1 Roteiro Cênico desenvolvido na disciplina Encenação e Jogo – Professor Marcos Bulhões ECA-USP 2010

Primeiro Movimento – Prólogo
•Fotografia após o casamento.
•Poema: Casamento – Manoel de Barros

Segundo Movimento – Festa de Família
•André que segurava uma bexiga, deixa-a escapar de suas mãos;
•André desloca-se da foto, caminha, sobe no primeiro banco e executa sua primeira partitura – NADAR NO AR.
•André volta para o chão, em direção ao grupo.
•Renata se desloca da foto. Faz jogo com a flor – elemento que traz consigo desde a foto.
•André toma flor de Renata e depois fica parado.
•Renata vai até o banco e executa sua partitura – NADAR DE BRUÇO.

Terceiro Movimento - Rupturas
•Tatiana desloca-se da foto, pega um cacho de bananas, corre, salta pelos bancos e entrega- as ao público.
•Tatiana volta em direção à foto. Pega a flor de André, volta e entrega-a à Patrícia que já está sentada no banco do primeiro plano, perto dos espectadores.
•Tatiana volta para traz.

Quarto Movimento – Desencanto
•Patrícia – sentada no banco – enche uma bexiga.
•Todos fazem mimese de encher bexiga;
•Patrícia depois da bexiga cheia, solta-a no ar e grita e despenteia-se.
•Parisi – no plano dos fundos, ainda na foto – fala um texto estranho. O texto é uma brincadeira em cima do texto de Hamlet: “Ser ou não ser...”
•Patrícia desloca-se para o gramado ao lado.
(Esta fica ao lado de uma placa: CUIDADO – NÃO PISE NA DRAMA)

APÊNDISE
Parisi – (ainda na foto) - Na preguiça solar da mesma sala grande onde fôramos felizes casais, célia e a cadeira de balanço choravam como um tango!

(O casal André e Renata conversam bucolicamente.)

Patrícia – (apontando para Patrícia, na grama) - Já viu sua filha como está grandinha?
André – Já.
Patrícia – Nem se importa com ela. Já teve sarampo e gripe. Quase ficou com olho torto.(silencio cheio de moscas.)
Patrícia – Diga a verdade! Recebi uma carta anônima contando tudo. Não há nada mais triste, que ser enganada. Você está apaixonado por uma atriz, Joãozinho! Conte tudo. Acho você envelhecido, preocupado, com cara de viciado, Joãozinho!
(fim do Apêndice)

Quinto Movimento – Nascer e Enlouquecer
•Patrícia nasce de Renata.
•Após ouvir Renata, André enlouquece e corre para um monte de folhas secas. Joga-as compulsivamente para cima.
•Tatiana no banco do primeiro plano, come as flores.
•Renata e Patrícia, correm em direção ao André e realizam a mesma ação que ele.
•Renata e Patrícia começam a jogar folhas em André.
•André corre para o público para se protejer.
•Os três enlouquecem: Jogam folhas nos espectadores.
•Tatiana continua comendo flores.
•OS três começam a jogar folhas em Tatiana.
•Tatiana levanta o ramalhete de flores.
•Os três hipnotizados, param.

Sexto Movimento – Diáfano e Telúrico
•Parisi se desloca da foto, vem executando uma dancinha. Sobe no banco do primeiro plano, levanta o vestido, saca um bombom da cueca. O bombom cai. Ele grita.
•Tatiana como uma hipnotizadora, joga as flores num tonel.
•Todos se dirigem para o tonel.
•Tatiana começa a comer arroz e em seguida cuspir para cima.
•Todos começam a cantar ao redor do tonel e cantar:


Krétutê, Kréputê, Peklelê, Lekreptilê, Lekrucpite –ê.
Krétutê, Kréputê, Peklelê, Lekreptilê, Lekrucpite –ê.
Krétutê, Kréputê, Peklelê, Lekreptilê, Lekrucpite –ê.

•Tatiana envolvida pela música, tira a calcinha e joga no tonel.
•Paris saca uma caixa de fósforos e coloca fogo na calcinha de Tatiana e nas flores.
•Todos iniciam uma espécie de ritual ao redor do tonel, envolvendo o público.

(Como sugestão cada qual do público deve escrever um pequeno pedaço de papel o que deseja queimar.)

Canto:

Se eu digo merda
Quero dizer....
Axé, evoé pra você....

Referências Bibliográficas:

    ARAÚJO, Antônio. A encenação-em-processo.  Anais do V Congresso Brasileiro de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas. Belo Horizonte: Abrace, 2008.  Disponível em: http://www.portalabrace.org/vcongresso/textos/territorios/Antonio%20Carlos%20de%20Araujo%20Silva%20-%20A%20Encenacao-em-Processo.pdf
   BONFITTO, Matteo. A cinética do invisível: processo de atuação no teatro de Peter Brook. Prefácio de David Brady. São Paulo: Perspectiva, 2009.
   COHEN, Renato. Performance como linguagem: criação de um tempo-espaço de experimentação. São Paulo: Perspectiva, 1989.
   DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Tradução de Bento Prado
Jr. E Alberto Alonso Muñoz. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992.
   FÉRAL, Josette. Por uma poética da performatividade: o teatro performativo. In:Sala Preta, Revista do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Eca/USP, São Paulo, n. 08, 2008.
   FERNANDES, Silvia e Guinsburg, J. - Um encenador de si mesmo - Gerald Thomas  
  GUINSBURG, J. e FERNANDES, Sílvia. O Pós-dramático: um conceito operativo?  São Paulo: Perspectiva, 2008.
   JANUZELLI, Antônio - Procedimentos Metodológicos no trabalho do ator
   GALIZIA, Luiz Roberto. Os Processos Criativos de Robert Wilson: Trabalhos de ArteTotal para o Teatro Americano Contemporâneo. São Paulo: Perspectiva, 1986.
   PUPO, Maria Lúcia Souza de Barros. O Pós-dramático e a Pedagogia Teatral.
   ROUBINE, Jean-Jacques. A Linguagem da Encenação Teatral.
  STALL, Ana Helens Camardo de - Primeiro Ato        





Still Life (Natureza-Morta)

Autor: Ipojucan Pereira.




O gênero pictórico Natureza-Morta ou Still Life tem provavelmente a sua origem no holandês Stilleven (natureza em pose), e em sentido amplo, juntamente com outros gêneros – retrato, paisagem, cenas do cotidiano etc. –, está relacionado ao termo “pintura de gênero”, que faz referência às representações da vida cotidiana, do mundo do trabalho e dos espaços domésticos. Natureza-Morta é um gênero de pintura em que se representam seres inanimados, geralmente objetos comuns que podem ser naturais (alimentos, flores, plantas, rochas ou conchas) ou artificiais (copos, livros, vasos, jóias, moedas, cachimbos, etc), todos referidos ao âmbito privado e à esfera doméstica, às vocações e aos hobbies, à decoração e ao convívio no interior da casa.

Na Europa do século XVII, esse gênero se desenvolveu nos Países Baixos, sobretudo na sua porção holandesa protestante, como um estilo sóbrio e realista, distante da exuberância barroca em pleno florescimento no resto do continente. Mas, mesmo assim era considerado de menor importância (em relação às pinturas históricas, mitológicas e religiosas), visto apenas como decorativo e de menor valor monetário. As composições simbólicas e grotescas de Giuseppe Arcimboldo (ca.1527-1593) – com frutas, animais e objetos – alimentaram o desenvolvimento da natureza-morta no período.

Caravaggio (1571-1610) é um dos pioneiros no gênero, exercitado entre 1592 e 1599. A opção pela pintura natural das coisas naturais – destacando a presença do corpo e a realidade pormenorizada do objeto pelos contrastes de luz e sombra –, a escolha de tipos populares para compor cenários religiosos e o gosto por “pinturas de gênero” marcam as obras do pintor milanês, um dos primeiros a desafiar a hierarquia imposta pelos teóricos da época, que viam a natureza-morta como um tema inferior.

O gênero alcançou o seu ápice no final do século XIX e início do século XX, nas conquistas formais de Cézanne (1839-1906), imortalizadas pelas composições impressionistas com maçãs executadas a partir de 1870 e nos girassóis de Vincent van Gogh (1853-1890). Entre 1910 e 1920, artistas cubistas, tais como Pablo Picasso (1881-1973) e Georges Braque (1882-1963), pintaram muitas composições de naturezas-mortas, introduzindo as primeiras colagens que deram origem ao Cubismo Sintético, como por exemplo, em "Natureza-Morta com Cadeira de Palha" (1912) de Picasso.

Marcel Duchamp (1887-1968) – e outros membros do movimento Dadaísta –, foi em uma direção radicalmente diferente criando o ready-made, naturezas-mortas de característica tridimensional. Uma outra importante ruptura foi dada pela Pop Art na década de 60-70, que criou uma nova abordagem do gênero, como por exemplo, nas pinturas de Andy Warhol (1928-1987) das latas de sopa Campbell, cujo verdadeiro tema era, na maioria das vezes, o marketing do produto representado em vez da fisicalidade do objeto em si.

Na arte contemporânea, a utilização de outros suportes tais como o corpo, a instalação, a fotografia, o vídeo, o computador nas representações de objetos inanimados mudou o sentido do gênero natureza-morta. E é o termo anglo-saxão Still Life o que mais se aproxima do sentido dessas obras, que retratam não exatamente a morte na natureza, mas um momento de suspensão da vida, que recorda ao espectador o transitório do tempo. Os artistas atuais retratam cenas da vida cotidiana, nas quais os personagens parecem ter sido paralisados no instante em que realizavam as suas ações comuns e rotineiras, em dramáticas imagens pictóricas ou esculturas hiper-realistas.

O trabalho do fotógrafo canadense Jeff Wall (1946-) busca outros conceitos pictóricos de representação enquanto flerta com o cinema. Muitas das suas fotografias revelam imagens grandiosas que são fabricadas numa organização quase industrial, já que contam com elenco, cenário, iluminação e equipe de pós-produção. A suspensão do tempo, aparentemente segundos após a chegada de uma súbita ventania, provoca uma oscilação nos parâmetros de reconhecimento em “A Sudden Gust of Wind (After Hokusai)” (1993). Imagens plausíveis, mas que instauram uma instabilidade por meio da qual vislumbramos a possibilidade de adentrar em uma outra dimensão do real. E juntamente com o interesse em fotojornalismo e em fotografia urbana, Wall apresenta obras, também elaboradas nos mínimos detalhes, que foram realizadas em ambientes internos, tais como “An Octopus” e “Some Beans”, ambas de 1990.

O encenador e artista visual americano Robert Wilson (1941-) é conhecido pelas suas peças teatrais inovadoras e de vanguarda. Paralelamente aos seus trabalhos em teatro ele desenvolve também uma carreira como artista visual. Na exposição de nome Portrait, Still Life, Landscape (1993), por exemplo, Wilson exibiu, lado a lado, dez ambientes na forma de instalações que evocavam as características dos gêneros pictóricos do retrato, da natureza-morta e da paisagem. Em 2007 ele fez uso do retrato como recurso poético na exposição Voom Portraits: provocantes vídeo-retratos de celebridades, artistas, intelectuais e até mesmo animais foram mostrados em telas de plasma de alta definição, afixadas às paredes como quadros. As figuras, colocadas em um cenário único e acompanhadas por uma trilha sonora original, apresentavam movimentos extremamente lentos, em rotinas de cerca de cinco minutos.

No catálogo dessa exposição, Wilson nos dá pistas da abordagem conceitual que faz desses temas, indicando o seu uso como procedimento de criação cênica:


Os vídeo-retratos podem ser vistos nas três formas tradicionais em que os artistas constroem o espaço. Se eu colocar minha mão na frente de meu rosto, posso dizer que é um retrato. Se vejo minha mão a distancia, posso dizer que é parte de uma natureza morta, e se a vejo do outro lado da rua, posso dizer que é parte do cenário (WILSON In Catálogo Voom Portraits, 2009).

A divisão e os enquadramentos do espaço, segundo Wilson, levam o espectador construir um gênero ou outro, ou seja, quanto mais próximos estivermos de um objeto, mas se configurará um retrato. Se nos distanciamos, e colocamos este objeto em relação aos outros elementos, enxergamos uma natureza-morta.

Assim, pode-se observar que essas naturezas-mortas de Bob Wilson nada mais são do que a organização dos elementos cênicos na busca de encontrar a melhor relação entre eles. Muitas vezes, nas suas peças teatrais, o que se vê são atores e objetos que não apresentam movimentos externos grandiosos, permanecendo muito tempo parados ou em movimentos muito lentos. Essa dinâmica de movimento torna-se fundamental para que esse tipo de composição aconteça, não apenas entre os atores como também entre os espectadores, a fim que estes percebam essas tensões entre as formas e criem as suas próprias interpretações.

Seguindo outra vertente, há alguns artistas que chegam a utilizar a si mesmos como naturezas-mortas, posando estáticos por horas em galerias ou espaços públicos, enquanto a vida ao seu redor continua no seu fluxo inexorável. O performer de rua alemão Johan Lorbeer (1950-) se tornou famoso nos últimos anos especialmente por causa das suas Still Life Perfomances, que ocorrem com freqüência em áreas públicas. Em várias dessas performances ele se apresenta em posições aparentemente impossíveis ao desafiar a lei da gravidade. Durante horas a fio ele permanece como uma estátua viva diante da platéia aturdida e desconcertada, cujo desejo de interagir cresce a ponto de muitas vezes tocarem o artista, na sua angelical e super-humana aparência, a fim de participar das suas habilidades. As suas instalações tais como “Proletarisches Wandbild” (1997) e “Tarzan” (2001) são famosas na Alemanha, mas ainda desconhecidas internacionalmente.

A coreógrafa alemã Pina Bausch (1940-2009), criadora do Tanztheater, em muitas das suas coreografias demonstra a necessidade de uma ambientação natural para as suas cenas. Ao cobrir o palco com flores, árvores, terra, lixo ou água, o seu intento era ver como esses elementos dialogavam com os movimentos e como eles estimulavam emocionalmente os bailarinos. Em “Nelken” (1998) encheu o palco com cerca de três mil cravos. “Cafe Müller” (1980) acontece numa sala abarrotada por dezenas de cadeiras. E em “O Barba Azul” (1977) o palco está coberto de papel rasgado e lixo.

Este procedimento de remeter o espectador para uma paisagem externa alcançou o seu ápice no filme “O Lamento da Imperatriz” (1989), de sua autoria. Em várias cenas vemos o contraste entre o movimento humano e a natureza estática, e vice-versa. Como por exemplo, temos no filme a cena de uma mulher sentada em uma poltrona, num cruzamento de uma rua, no meio do trânsito, fumando tranqüilamente o seu cigarro. Ou, numa outra seqüência, um homem semi-nú dança solitário de forma lânguida, com o corpo coberto de lama, numa estufa repleta de flores. E esse mesmo personagem reaparece em num plano posterior sentado imóvel, de olhos fechados e rodeado de flores, enquanto vemos através da parede envidraçada da estufa o movimento da rua. Temos novamente aqui o procedimento de uso da natureza-morta na criação cênica, tanto no jogo entre suspensão e movimento quanto na conjugação de objetos e intérpretes.

Oscilando entre a realidade e a fantasia, outros criadores e grupos contemporâneos tem utilizado o procedimento de natureza-morta para erigir um mundo desorientado, um drama estranho e surreal em que as figuras imóveis atuam em estranhas performances diante de nossos olhos. O grupo napolitano Malatheatre, uma mistura de artistas, estudantes, músicos, bailarinos liderado pela diretora e cenógrafa Ludovica Rambelli, por exemplo, apresentou em 2006 um trabalho de grande impacto visual: "Caravaggio: la conversione di un cavallo". A partir da técnica de tableaux vivants (natureza-morta), os performers imobilizavam-se diante do público, reconstituindo as dramáticas cenas dos quadros de Caravaggio.

O artista americano Charles Ray (1953-) é conhecido pelas suas esculturas estranhas e enigmáticas que provocam a percepção do espectador, interferindo na escala dos objetos e propondo formas dissonantes e inesperadas. Tem usado repetidamente o seu corpo como elemento escultórico, criando híbridos, trabalhando mais e mais com manequins e modelos. “Oh! Charley, Charley, Charley...” (1992), provavelmente está entre os seus trabalhos mais conhecidos. Aqui vemos uma escultura de uma orgia sexual envolvendo oito figuras de fibra de vidro, que são moldes do corpo do próprio artista. Essa “orgia solitária”, em que os oito Charleys fazem sexo oral e anal entre si, é uma natureza-morta do erotismo narcisista. Na esteira desse exemplo, é impossível não deixar de citar o artista polonês, pintor, cenógrafo, encenador Tadeusz Kantor (1915-1990), que no seu espetáculo “A Classe Morta” (1975) também compunha cenas usando manequins e atores, a matéria viva e a inanimada conjugadas para afirmar que a expressão de vida no âmbito da arte só pode se dar pela sua ausência.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

LIVROS:
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo, Editora Schwarcz LTDA, 2004.
BROOK, Peter. O Teatro e seu Espaço. Rio de Janeiro, Ed. Vozes Ltda., 1970.
CALDEIRA, Solange Pimentel. O Lamento da Imperatriz: a linguagem em trânsito e o espaço urbano em Pina Bausch. São Paulo, Annablume, 2009.
COHEN, Renato. Performace como Linguagem: Criação de um Tempo – Espaço de Experimentação. São Paulo, Edusp / Perspectiva, 1989.
___________. Work in Progress na Cena Contemporânea. S. Paulo, Ed. Perspectiva, 1998.
EBERT-SCHIFFERER, Sybille. Still Life: A History. Harry N. Abrams, New York, 1998
FOSTER, Hal. The Return of the Real. Londres, MIT Press, 1996.
GALIZIA, Luiz Roberto. Os Processos Criativos de Robert Wilson. São Paulo, Ed. Perspectiva, 2005.
GARCIA, Silvana. As Trombetas de Jericó – Estética e Política no Teatro das Vanguardas Históricas. Campinas, Hucitec, 1997.
GLUSBERG, Jorge. A Arte da Performance. São Paulo, Editora Perspectiva, 1987.
GOLDBERG, RoseLee. A Arte da Performance: do Futurismo ao Presente. São Paulo,
Martins Fontes, 2002.
JONAS, Joan e HOFFMANN, Jens. Art Works Perform. New York, Thames & Hudson, 2005
KRAUSS, Rosalind. Caminhos da Escultura Moderna. São Paulo, Martins Fontes,1998.
LEHMANN, Hans-Thyes. Teatro Pós-Dramático. São Paulo, Cosac & Naify Edições, 2007.
MARTINS, Marcos Bulhões. Encenação em Jogo. São Paulo, Hucitec, 2004.
MC EVILLEY, Thomas. Sculpture in the Age of Doubt. New York, Allworth Press, 1999.
PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. São Paulo, Editora Perspectiva, 1999.
SÁNCHEZ, José A. Dramaturgias de la Imagen. Cuenca, Ediciones de la Universidad de Castilla – La Mancha, 2002.
SHECHNER, Richard. Performance Theory. New York, Routledge, s/d.
UBERSFELD Anne. Semiótica teatral. Ed. Cátedra, Madrid, 1989.

ARTIGOS:
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FERAL, Josette. Theatricality: The Specificity of Theatrical Language. Substance 98/99, vol. 31, no 2 e 3, 2002, p.94-108.

CATÁLOGOS:
Catálogo, Voom Portraits. São Paulo, SESC Pinheiros, 2008.

O ROTEIRO CÊNICO NO PROCESSO CRIATIVO DE GRUPO:

UM SALTO DAS ORIGENS À CENA TEATRAL CONTEMPORÂNEA

(Por Cleber Lima)

Pavis define em seu Dicionário de Teatro que a origem da palavra roteiro remete ao período renascentista, onde, na língua italiana, a mesma era entendida como cenário. Não podemos confundir esta definição com seu emprego na atualidade, enquanto elemento teatral que caracteriza os espaços da encenação. No período em que surgiu, cenário remetia muito mais ao contexto geral que envolvia as encenações, como temas, ações e maneiras de representação, do que a um lugar propriamente dito. A Commédia dell’arte, forma teatral surgida no século XVI, na Itália, foi o contexto embrionário do termo roteiro, que designava o canevas. A Commédia dell’arte caracterizou-se principalmente, pela exigência conjunta de habilidade de improviso e técnica de seus intérpretes. Suas peças não possuíam textos com estruturas dramáticas formais, contendo todas as falas e rubricas que seriam empregadas na encenação, mas sim indicações de ações, formas de representação e o argumento, apontados no canevas. Além disto, o canevas também trazia os lazziz, que pode ser definido como elemento mímico e de improvisação, onde o ator caracterizava comicamente suas personagens; quase como que um gestus cômico.

Atualmente o roteiro é utilizado principalmente no cinema, onde apresenta quase que as mesmas indicações, incluindo-se as falas das personagens. No teatro, o roteiro encontra eco em formas teatrais contemporâneas, onde os processos de criação são norteados por propostas colaborativas ou coletivas, onde, normalmente, a hierarquização entre texto, encenação e atuação é minimizada ou diluída. Podemos observar, em relação a estrutura formal do roteiro nos contextos citados anteriormente, a presença de imagens, textos, símbolos e códigos que refletem uma linguagem própria deste instrumento, uma multilinguagem, que favorece o experimentalismo ao mesmo tempo que possibilita uma visão do todo pensado inicialmente. Há espaço para a proposição de diversos signos estéticos, elementos cênicos e propostas temáticas e ideológicas, ao mesmo tempo em que, dialeticamente, pressupõe a busca da síntese entre eles. Neste sentido, ousamos dizer que nos contextos cênicos da contemporaneidade, é mais coerente referirmo-nos a uma “escrituração cênica” do que a um texto de estrutura dramática ou pós-dramática. Desta forma, apropriando-nos da idéia de Pavis sobre a escritura cênica como “o modo de usar o aparelho cênico para pôr em cena, em imagens e carne, as personagens, o lugar e a ação que aí se desenrola”, o roteiro cênico apresenta sua contribuição inicial para este processo, no sentido de não limitar as possibilidades de criação no momento em que é encenado, ou seja, quando os elementos dramáticos “onde”, “quem” e “o que” são colocados na cena em busca de vida. As contribuições do uso do roteiro cênico, enquanto procedimento de criação no teatro, se ampliam na medida em que ele favorece sua própria retomada durante todo o processo de criação e encenação. Contribuições oriundas do processo de trabalho com o elenco e até mesmo das experiências pessoais dos integrantes do grupo são passíveis de absorção pelo roteiro cênico inicial, o que torna sua escritura um processo dinâmico e vivo, intrinsecamente ligado à trajetória do grupo e à vivência de seus integrantes.


A cena do teatro pós-moderno é campo fértil para a utilização e ampliação das possibilidades do roteiro cênico como um procedimento de criação artística. Considerando que, segundo Guinsburg, Faria e Lima, em seu Dicionário do Teatro Brasileiro, o conceito de teatro pós-moderno surge com a produção cultural do pós era industrial, onde a sociedade é arrebatada pelos princípios capitalistas e pelos avanços tecnológicos, percebemos a influência de outras linguagens e mídias na cena teatral a partir da década de 50.

“Neste ambiente sociocultural ultradesenvolvido, novos procedimentos de linguagem marcam presença, estreitando o antigo fosso entre uma cultura erudita e outra de massa, tais como a intertextualidade, a citação, a paródia,a ironia, o humor, o entretenimento, a desconstrução de todos os discursos instituídos.” (GUINSBURG, FARIA e LIMA, 2009, p.276)

Esta influência se deu inicialmente pela arquitetura, dança, música e cinema, dos quais passou-se a utilizar procedimentos de linguagem em formas teatrais de forma embrionária.

“As artes cênicas assistirão, a partir de 1950, ao surgimento do happening e da performance como procedimentos modelares destas novas configurações. A atitude experimental que lhes é subjacente ganhará impulso, apontado o teor vanguardista com que surgiram.” (GUINSBURG, FARIA e LIMA, 2009, p.276)

Estas novas formas de expressão cênica encontram no roteiro cênico relevante importância como um procedimento facilitador de processos experimentais, onde a intertextualização e a hibridização são características recorrentes, contribuindo para a dinâmica de processos de criação coletivos onde há sempre a possibilidade de retomadas no percurso de criação e onde a recepção é elemento revisto e considerado como parte integrante deste ciclo criativo. Podemos citar como pioneiros deste teatro pós-moderno, em nosso país, os grupos Arena e Oficina em São Paulo, e o Ipanema e Opinião no Rio de Janeiro, fundados entre as décadas de 50 e 60 e que durante sua trajetória experimentaram ou tem como proposta de criação artística, práticas coletivas que caracterizam os princípios do Teatro de Grupo no Brasil. Segundo GUINSBURG, FARIA e LIMA, “são grupos que invariavelmente, realizam treinamento e pesquisa contínuos na preparação do intérprete, da cena, do texto e dos demais elementos constitutivos do espetáculo.” No teatro de grupo a poética se consolida através da convergência entre ética e estética, o que favorece a consolidação de um trabalho em equipe, aproximando dramaturgo, encenador e elenco. Neste contexto, o roteiro cênico torna-se grande aliado para a dinâmica de escrituração cênica e dramatúrgica dos espetáculos, na medida em que facilita, de forma dinâmica e dialógica, quantas retomadas se fizerem necessárias no processo de criação.

Concomitantemente, surgem nas décadas de 60 e 70 os conjuntos teatrais de criação coletiva. Segundo GUINSBURG, FARIA e LIMA, estes grupos “associam todos os elementos da encenação, inclusive o texto em um mesmo processo de autoria baseado na experimentação em sala de ensaio.” Nesta forma teatral, o texto prescinde de sua posição hierárquica no processo de criação, sendo um elemento que será criado durante o processo de trabalho do grupo e oriundo, principalmente, dos estados, inquietações e contextos individuais e coletivos de cada grupamento. GUINSBURG, FARIA e LIMA citam o Pod Minoga (SP) como importante grupo desta nova proposta de trabalho colaborativo, sendo que este “realizou, entre 1972 e 1980, sete espetáculos em criação coletiva sem que o texto, à exceção de Folias Bíblicas (1977) e Salada Paulista (1978), jamais fosse escrito: em cada apresentação, o roteiro de ações criado a partir das improvisações permitia que a palavra se mantivesse permeável ao imprevisto.” Desta forma, no teatro de criação coletiva, o roteiro cênico torna-se elemento fundamental para a consolidação da proposta de trabalho coletivo e da poética do grupo, haja vista seu caráter aberto em relação às falas e diálogos da encenação e a sua flexibilidade de retomada em sua estrutura, elementos de linguagem e consequentemente no jogo de cena.

Já a partir da década de 80 tem início, em São Paulo, mais precisamente com o Teatro da Vertigem, o processo colaborativo de criação teatral. Suas raízes remontam da criação coletiva e é contemporâneo ao surgimento do conceito de ator-criador. O processo colaborativo neutraliza a hierarquia dentro do processo de criação do grupo e coloca todos os seus integrantes na função de criadores:

“Surge da necessidade de um novo contrato entre os criadores na busca da horizontalidade nas relações criativas, prescindindo de qualquer hierarquia preestabelecida, seja de texto, de direção, de interpretação ou qualquer outra. Todos os criadores envolvidos colocam experiência, conhecimento e talento a serviço da construção do espetáculo, de tal forma que se tornam imprecisos os limites e o alcance da atuação de cada um deles, estando a relação criativa baseada em múltiplas interferências.” (GUINSBURG, FARIA e LIMA, 2009, p.279)

O processo colaborativo pode ser inserido no contexto das manifestações do teatro pós-dramático, e praticamente prescinde do texto dramático, se constituindo a partir da evolução criadora da cena, exigindo a presença do dramaturgo ou de uma dramaturgização durante todo o processo de trabalho do grupo. Isto posto, o roteiro cênico figura mais uma vez como procedimento essencial na dinâmica do trabalho criativo do grupo. O jogo de cena se coloca como a base para a criação da encenação, sendo que sua estruturação não deve tolher as possibilidades de criação nem tão pouco ser tão aberta que possa esvaziar o sentido, provocando a perda de foco no trabalho de criação do grupo. Assim, o roteiro cênico contribui para a elaboração destes jogos de cena, de forma intertextual e oportunizando uma multilinguagem ao estruturar diferentes signos numa proposta cênica.

“Não existe um modelo único de processo colaborativo. Em linhas gerais, ele se organiza a partir da escolha de um tema e do acesso irrestrito de todos os membros a todo o material de pesquisa da equipe. Após esse período investigativo, idéias começam a tomar forma, propostas de cena são feitas por quaisquer participantes e a dramaturgia pode propor uma estruturação básica de ações e personagens, com o objetivo de nortear as etapas seguintes. Damos a essa estruturação o nome de canovaccio, termo que, na Commédia dell’arte italiana, indicava o roteiro de ações do espetáculo, além de indicações de entrada e saída de atores, jogos de cena etc.” (GUINSBURG, FARIA e LIMA, 2009, p.276)

Encontramos, dentre outros, nos experimentos de Renato Cohen e Marcos Bulhões Martins, ecos mais recentes de experiências teatrais onde o roteiro cênico foi empregado como procedimento no processo de criação. Cohen em seu Sturm und Drang (1995), se utiliza do roteiro cênico e o nomeia como storyboard, como sendo o “texto/imagem” que é “composto a partir de emissões de vida, primeiridades, laboratórios, adaptação de textos, sinais e outras emissões que vão formar uma textualização viva”, segundo o próprio autor-encenador. Na linguagem work in process, utilizada por Cohen, o texto é construído de forma processual e se constituí a partir de uma rede de pluralidades, instantaneidades e sincronismos. Desta maneira, a construção do roteiro cênico (storyboard) em Sturn und Drang, segundo o próprio Cohen, “substitui a narrativa clássica – causal, diacrônica – desloca a organização temporal para uma organização espacial”, o que é favorecido pela estrutura visual e de multilinguagem do roteiro cênico.

Já no experimento cênico 1999 (1999), Martins se utiliza do roteiro cênico como procedimento aglutinador de material de pesquisa própria e do grupo, sejam eles fotos, textos literários, poesias, frases, relatos pessoais ou de experiências do grupo levantados durante o processo. Mais do que aglutinar, percebe-se o poder de síntese que o roteiro cênico desempenhou durante o processo de criação de 1999, uma síntese em constante reconstrução, síncrona com o processo de criação nos jogos de cena. Outro aspecto que se sobressai é a metodologia proposta pelo encenador de maneira que todo o grupo participou de forma colaborativa na construção do roteiro final:

“Nosso objetivo sempre foi encontrar um equilíbrio entre três espécies de autorias: o encenador, os escritores dos fragmentos e os atores que improvisam, selecionam, editam e escrevem textos para a cena. Buscamos uma dramaturgia de caráter coletivo que, além de ser um meio para a formação de um discurso, fosse um experimento sobre a natureza humana que visa modificar os que a realizam.” (MARTINS, 1999, p. 138)

Assim, lançando um olhar mais atento aos processos de escrituração cênica contemporâneos, podemos verificar que o roteiro cênico situa-se como procedimento de criação que favorece os processos onde a busca pela poesia permeia os caminhos do híbrido, da justaposição, do fragmentado, do experimento, do hipertexto, da linguagem multimídia, da cena ambiental, diluindo a hierarquia entre os elementos da cena e elevando a criador todos os integrantes de um coletivo interessado na criação cênica.


O ROTEIRO CÊNICO NA PRAXIS DO NÚCLEO XIII DE ARTES DRAMÁTICAS: PEGADAS NO CAMINHO

(Por Cleber Lima)

Durante a minha participação na disciplina Encenações em Jogo, coordenada pelo Professor Dr. Marcos Bulhões Martins, no curso de Pós-graduação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, um dos procedimentos utilizados foi o roteiro cênico. A proposta inicial foi a criação de um roteiro livre, de no mínimo três e no máximo cinco quadros, que expressasse o desejo de criação do diretor sem qualquer limitação. Este roteiro deveria ser entregue ao professor na aula seguinte. A segunda etapa consistiu na feitura de outro roteiro cênico completamente novo, considerando em sua composição os procedimentos de escritura cênica do modelo “wilsiano”. Na terceira etapa, a proposta foi a criação de um novo roteiro cênico a partir de uma “Figura Cênica” do universo poético de Bob Wilson. Os roteiros desta etapa foram apresentados para o grupo na semana seguinte, sendo que alguns foram escolhidos para serem encenados, num primeiro momento através do jogo do diretor (forma autocrática) e num segundo de forma colaborativa. A quarta etapa foi a criação de um roteiro cênico a partir de um texto indicado pelo professor (“Doctor Fautus Lights the lights”, de Gertrude Stein). Três roteiros desta etapa foram encenados na aula seguinte, inicialmente de forma autocrática, seguindo as indicações do diretor e em seguida os roteiros foram revistos e modificados pelos atores e dramaturgos de cada grupo, de forma colaborativa. Através do movimento proposto pelo trabalho com o roteiro cênico, ficou evidente um percurso de criação e ampliação de repertório no processo de encenação. O roteiro cênico enquanto procedimento de trabalho, possibilitou a participação de cada integrante enquanto criador de poéticas, o compartilhamento destas poéticas no grupo, a ampliação do repertório estético inicial e a síntese de propostas de forma que o resultado atingido no final do processo refletiu, na medida permitida pelo tempo de trabalho na disciplina, a justaposição de poéticas individuais numa criação coletiva de cada grupo.

Paralelamente ao desenvolvimento da disciplina, realizei alguns experimentos de utilização do roteiro cênico enquanto procedimento de trabalho com o Núcleo XIII de arte dramáticas, composto por atores amadores. O núcleo é mantido pela Faculdade Campo Limpo Paulista (FACCAMP), instituição onde leciono em cursos da graduação e pós-graduação lato sensu, e é composto por alunos dos cursos de Química, Engenharia, Rádio e TV, Pedagogia, Administração, Arte-educação e Gestão Empresarial. Na ocasião, o grupo desenvolvia uma pesquisa a partir da obra “O Guarani” de José de Alencar, o Romantismo e o Realismo na literatura brasileira do século XIX. A proposta do grupo é realizar uma encenação com poética própria, a partir do universo proposto na obra “O Guarani”. Desde o início da proposta, a idéia de que o grupo todo participasse do processo de escrituração cênica era latente, e acabou por encontrar eco na experiência com o roteiro cênico da disciplina que estava vivenciando na ECA-USP.

Assim, estruturei um pequeno experimento com o roteiro cênico para o trabalho com o Núcleo XIII:

1ª Etapa – O grupo foi orientado a criar, individualmente, um roteiro cênico onde cada um dos quatro primeiros capítulos de “O Guarani” correspondesse a um quadro do roteiro (Cenário, Lealdade, A Bandeira e Caçada). Na tentativa de induzir a criação de roteiros não centrados no realismo dramático, o grupo foi instruído de que o foco seria a sensorialidade do quadros. Assim, cada quadro deveria ter uma proposta de “respiração, peso, ritmo, cor, cheiro e temperatura”.

2ª Etapa – Todos os integrantes apresentaram seus roteiros ao grupo, que através de um consenso, escolheram três para serem encenados. O autor de cada roteiro assumiu a função de diretor e cada roteiro foi encenado a partir do jogo do diretor, de forma autocrática. Cada diretor poderia utilizar todos os recursos cênicos disponíveis no espaço (luz, som, cenários, adereços) e outros que julgasse necessário. Durante a avaliação a principal dificuldade apontada pelo grupo foi a dificuldade de transposição dos elementos sensoriais para a cena. O que foi constatado a partir da percepção de que os quadros ainda tinham um forte tom dramático. O grupo então foi orientado a criar novos roteiros cênicos para o próximo encontro, a partir de outros quatro capítulos da obra de José de Alencar (Loura e Morena, A Volta, A prece e Três Linhas), agora atentando não somente para a sensorialidade dos quadros como também para a utilização de símbolos expressionistas.

Assistam ao vídeo com com alguns resultados poéticos desta etapa:http://www.youtube.com/watch?v=nD5QDpg6BTk

3ª Etapa - Os roteiros foram apresentados ao grupo e notou-se a identificação entre alguns quadros por parte do grupo, que acabou optando por não escolher alguns roteiros para ser encenados, mas sim por realizar uma “colagem” dos quadros que causaram a identificação do grupo e montaram um novo roteiro come esta proposta. Desta vez a encenação foi conduzida de forma colaborativa, não havendo a presença de um diretor. A avaliação foi mais positiva em relação ao encontro passado. Uma linha poética de criação começou a despontar no grupo. A presença dos símbolos expressivos no roteiro levou o grupo a uma encenação mais fisicalizada, o que levou os integrantes a um estado de energia que não havia experimentado até então. O grupo foi orientado então, para a criação de novos roteiros cênicos a partir de outros capítulos (Amor, Ao Alvorecer, No banho e A Onça). Desta vez, manteve-se o foco na sensorialidade e nos símbolos expressivos, porém, o grupo deveria (a exemplo de outros procedimentos vivenciados na disciplina Encenações em Jogo) também pesquisar vídeos no youtube sobre as técnicas corporais de Rudolf Laban, selecionando uma sequência de movimentos e apresentar a mímese dos movimentos no formato de uma pequena partitura corporal no próximo encontro.
Assistam ao vídeo com com alguns resultados poéticos desta etapa: http://www.youtube.com/watch?v=BWBBtrGuEm0

4ª Etapa – Antes da apresentação dos roteiros, cada integrante apresentou sua partitura corporal pesquisada nos vídeos sobre Laban. A exemplo dos procedimentos de aquecimento vivenciados na disciplina Encenações em Jogo, foram propostos jogos de aquecimento corporal onde cada um apresentava sua citação sobre a partitura pesquisada e o outros se apropriavam e repetiam os movimentos. Em seguida, o grupo foi dividido em dois subgrupos, criando-se dois coros onde um integrante por vez comandava o jogo, realizando sua citação de partitura corporal e os outros repetiam os movimentos. Os dois subgrupos jogavam simultaneamente. Passamos então a apresentação dos roteiros cênicos e o grupo mais uma vez optou pela encenação de uma colagem entre os quadros criados em cada roteiro. Desta vez, o grupo foi instruído a utilizar-se, de alguma maneira, das citações corporais pesquisadas e trabalhadas durante o aquecimento na proposta de encenação do roteiro. A avaliação foi extremamente positiva na medida em que o resultado estético deu um salto em relação às etapas anteriores, um estado de êxtase e euforia se instalou no grupo e a proposta de um teatro da poética corporal se instaurou e abriu novas perspectivas criadoras para a proposta de montagem a partir de “O Guarani”. O realismo dramático começava a ser superado pelo grupo e as possibilidades poético-expressivas se expandiam. Para o próximo encontro, o grupo foi orientado a realizar a mesma pesquisa no youtube, só que agora sobre o teatro-dança de Pina Baush, com a mesma proposta da mimese; e a criação de novos roteiros cênicos a partir dos três últimos capítulos de “O Guarani” (Revelação, A Índia e Os Três).

Assistam ao vídeo com com alguns resultados poéticos desta etapa: http://www.youtube.com/watch?v=xZ0ERwtsANA

5ª Etapa – Seguimos a proposta da etapa anterior, e cada integrante apresentou sua citação de partitura corporal a partir da pesquisa sobre o teatro-dança de Pina Baush e os outros seguiam os movimentos, apropriando-se da citação. Em seguida, o grupo foi estimulado a criar suas próprias partituras, criando a partir do estímulo externo de músicas selecionadas das trilhas sonoras utilizadas nas obras de Pina Baush. Foram instruídos também a investir no procedimento da repetição, recorrendo à citação já apropriada (leitmotiv) sempre que sentissem uma queda da energia motivadora no processo. Seguiu-se a apresentação dos roteiros e a dinâmica se deu da mesma maneira que a etapa anterior, ou seja, o grupo apropriou-se da colagem entre os quadros criados por todos como um procedimento de criação e montaram um novo roteiro a ser encenado pelo grupamento. Desta vez não se fez necessária a instrução de utilização das citações e partituras corporais próprias na encenação do roteiro cênico, pois foi uma ocorrência natural durante o processo de escrituração cênica. A avaliação foi bastante positiva, na medida em que a experiência validou o desejo do grupo em buscar uma poética teatral mais corporal e encontrou eco no teatro-dança de Pina Baush, estimulando todo o grupo a pesquisar mais e aprofundar as pesquisas sobre o teatro-físico e o teatro-dança na escrituração cênica da montagem de “O Guarani”.

Assistam ao vídeo com com alguns resultados poéticos desta etapa:http://www.youtube.com/watch?v=h9V97GBuioU

O Núcleo continua seu processo de pesquisa e, sincronamente, de escritura cênica do espetáculo “O Guarani”. Porém, após este experimento com o roteiro cênico algumas conclusões já podem ser apontadas. A utilização do roteiro cênico como um procedimento de trabalho demonstrou-se um poderoso meio de criação, aglutinador de propostas individuais e facilitador na elaboração de uma escritura cênica coletiva, abrindo espaço para diferentes linguagens poéticas e dinamizando o processo.
Referências bibliográficas:
COHEN, Renato. Work in progress na cena contemporânea: criação, encenação e recepção. São Paulo: Perspectiva, 2006.

GUINSBURG, J., FARIA, João Roberto e LIMA, Mariângela Alves de (Coord.). Dicionário do teatro brasileiro: temas, formas e conceitos. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Perspectiva: Edições SESC SP, 2009.

MARTINS, Marcos Bulhões. Encenação em jogo: experimento de aprendizagem e criação do teatro. São Paulo: Hucitec, 2004.

PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro; tradução para a língua portuguesa sob a direção de J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. São Paulo: perspectiva, 1999.

TEATRO FÍSICO E DIÁLOGO POÉTICO NA AÇÃO DA MIMESE

por Bru Palmieri


Introdução

A metáfora da arte como espelho da natureza, corporifica a mimesis ou mimese no qual Abrams (1953: 8) aponta como "provavelmente a mais primitiva teoria estética”. Tanto Dinis quanto Aristóteles viam, na mimesis, a representação da natureza. Contudo, para Platão, “toda a criação era uma imitação, até mesmo a criação do mundo era uma imitação da natureza verdadeira” (o mundo das idéias). Sendo assim, a representação artística do mundo físico seria uma mimese de segunda mão. A Poesia pela qual a linguagem humana é utilizada, é uma “mimese pela voz e distingue-se assim das Artes Plásticas que imitam pela forma e pela cor”. Esta definição permite a Aristóteles estabelecer diferentes formas poéticas, desde a dança que imita apenas pelo rítmo, até a poesia lírica, a tragédia e a comédia, que imitam pelo rítmo, pela linguagem e pela melopéia. Aristóteles, que neste ponto se aparta de Platão ou antes o corrige, a arte imita “os caracteres, as emoções e as ações”. A arte é a poesia, a obra o poema, o poeta o artífice."[1]

Entre as instituições, o sentido do drama, melhor que outra qualquer, reproduz a ação. Num contexto mais alargado, esta temática não somente propõe a pesquisa teórica como a experimentação prática de processos compositivos do artista pela mimetização da ação da cena - dit, bauschiana[2] ,estabelecendo relações com elementos constitutivos das obras literárias, alicerçada no conceito de trabalho compreendido como uma idéia fundamental no movimento de refundação da tradição do corpo cênico efetivado no século XX para a arte de ator; um ator–criador livre dos domínios da literatura, do racionalismo objetivista e do naturalismo. O ator-criador é o ponto de partida para se realizar esta mudança. O seu pensamento é o pensamento do corpo. Os seus objetivos principais são: reconhecer a dramaturgia do corpo do ator como cerne da criação teatral, o fim da dicotomia autor/ator, criador/obra, mente/corpo e a mudança na posição do ator no seu processo de comunicação, migrando de ator-intérprete para ator-criador.

Tais pensamentos estão ligados diretamente ao movimento artístico surgido no início do século passado, na França, liderado por Jacques Copeau (1879–1949), em seus conceitos pedagógicos de poética, ética e estética, o qual advertiu aos artistas, acerca da importância do corpo no processo de criação. Através de sua escola Theatre du Vieux-Colombier, diretor, autor, dramaturgo e ator de teatro francês, Jacques Copeau[3] teve contato com Étienne Decroux (1898-1991), passando a ser considerado e reconhecido como o criador da mímicamoderna. Mestre de Jean Louis Barrault (1910-1994), Marcel Marceau (1923-2007), Lindsay Kemp[4]entre outros, Decroux devotou toda a sua vida ao estudo desta forma de arte, criando uma técnica e uma gramática corporal decodificada e refinada. Proveniente do mesmo movimento iniciado por Copeau, Jacques Lecoq (1921-1999) completa o rol de artistas que formaram a base para o desenvolvimento da Mímica Contemporânea e do Teatro Físico. Menção a um dos mais respeitados profissionais de teatro da atualidade, Peter Brook, influenciado pelo trabalho de dramaturgos como Bertolt Brecht e Antonin Artaud, propõe um teatro de caracterização psicológica dos personagens que torne visível a "invisível" alma humana.

O teatro, mais do que ser um local público onde se vê, é o lugar condensado das ambiguidades e paradoxos, onde as coisas são tomadas em mais de um sentido. Camargo assim o define (2005:1):
“O vocábulo grego Théatron (θέατρον) estabelece o lugar físico do espectador, ‘lugar aonde se vai para ver’ e onde, simultaneamente, acontece o drama como seu complemento visto, real e imaginário. Assim, o representado no palco é imaginado de outras formas pela platéia. Toda reflexão que tenha o drama como objeto, precisa se apoiar numa tríade teatral: quem vê, o que se vê, e o imaginado. O teatro é um fenômeno que existe nos espaços do presente e do imaginário, nos tempos individuais e coletivos que se formam neste espaço".

Isto posto, o século XX caracterizou-se pelo surgimento de novas formas de compreendermos o fenômeno teatral, a exemplo, a teoria do poeta, ator, escritor, dramaturgo, roteirista e diretor de teatro francês Antonin Artaud, desenvolvida na obra O Teatro e seu Duplo, por tratar-se de uma revolução na forma de conceber essa manifestação artística. Possivelmente, como uma reação diante de fórmulas teatrais esquemáticas e ultrapassadas, Antonin Artaud[5], dizia que o teatro deveria ser considerado como “um Duplo, não da realidade cotidiana e direta da qual foi reduzido a ser uma mimese inerte, mas de uma realidade perigosa e arquetípica”.
Portanto, para tornar-se essencial, o teatro deve nos dar tudo o que pode ser encontrado no amor, no crime, na crueldade, na guerra ou na loucura - vide manifestações artísticas de La Fura Dels Baus em Degustación de Titus Andrônicus, DE LA GUARDIA & De la Guarda* em Fuerza Bruta, e nas cenas insólitas de Pina Bausch em Die Klage der Kaiserin - Part 6 / 8.


CENÁRIO E POSSIBILIDADES

Abordagem

É nesta essencialidade, que tem que ser desenvolvida a idéia de um teatro que ultrapasse todos os nossos preconceitos e que implique uma ação extrema levada aos últimos limites, sem, portanto; deixar de ser uma realidade verossímil. Logo, deve-se conceber um espetáculo dirigido ao orgânico, no qual haja uma mobilidade intensiva de objetos, gestus, signo , que serão utilizados em um novo sentido, uma vez que o teatro necessariamente requer uma expressão no espaço, e a não sujeição do teatro ao texto no cenário contemporâneo. A partir deste entendimento, procura-se discutir a dimensão volitiva e consciente na busca de organicidade e precisão no trabalho de composição da ação física do ator. Propõe-se, ainda, uma reflexão acerca do conceito de ator-bailarino, entendendo que se trata de uma noção híbrida instalada num campo investigativo que refuta a dualidade de alguns binômios firmados historicamente, no qual movimento abstrato e ação física dialogam na perspectiva da criação de uma dramaturgia pautada no movimento e na fisicalidade do ator-criador; em um processo de atuação e criação da cena teatral pela (não)verbalização do texto e/ou glossolalias em linguagem física; assim denominado Teatro Físico. Temos também testemunhado a uma particular e apelativa convergência intelectual e institucional entre a história e filosofia da arte e o estudo cultural do espaço, por um lado, e a história do teatro e teoria, sobre a outra. Esta convergência é motivada por uma idéia de cultura que incorpora três interbloqueamentos sob a perspectiva da pesquisa: um objeto de base (performance visual e suas inter-relações), um institucional (abordagem da investigação multidisciplinar), e uma teórica (a interrogação filosófica da natureza social de visão e visualidade, sobretudo nas suas formas teatralizadas).


REGISTRO

O campo da Arte Dramática abraça o estudo da história e estética dessas artes performáticas, pela importância da Performance como linguagem artística, mas infelizmente, um veículo de comunicação tão pouco conhecido, e levianamente empregado a qualquer proposta vulgo denominada 'criação artística', e que fuja do convencional, obviamente. A Performance não é/está, representada por meio de habilidade ou simples destreza física do artista. A Performance como expressão artística, nunca foi, não é, e jamais será Teatro Experimental e anos - luz às teorias de Teatro Experimental de Grotowski, Brecht, Gurdjieff bem como dos trabalhos de Gordon Craig e Stuart Davis. No Brasil, o que se afasta do convencional, da forma e estética, é denominado vanguarda ou pós-moderno. No entanto, uma Performance, na Performing Arts, geralmente inclui um evento no qual o(s) Performer(s), se comporta(m) de maneira particular a outro grupo de pessoas (a platéia). Entretanto, a linha divisória entre Performer e platéia, torna-se tênue. A Performance se divide em vários gêneros, que por sua vez, se dividem em subgêneros, e estes; em sub/subgêneros, e a nós, expectadores, nos cabem compreender qual via de atuação o Performer performa.


DO PRAZER DE PENSAR À SATISFAÇÃO DE ATUAR

Dinâmica de movimento: escalas corporais, presença cênica, coro e arte do improviso e criação.

No âmbito da disciplina “Encenações em Jogo” no curso de Pós Graduação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, CAC/ECA/USP, ministrado pelo Prof. Dr. Marcos Bulhões; a prática desenvolveu-se em procedimentos via criação de roteiros cênicos, em quatro diferentes etapas, sendo a última desenvolvida a partir da criação de um roteiro de um texto de Gertrude Stein, cujo processo laboratorial – conduzido por um “diretor e seus atores”, na forma colaborativa e participativa de criação de repertório – manifestação do teatro dito pós-dramático; evidenciava-se a cada encontro semanal, pela consistência na experimentação de procedimentos criativos, através da composição de partituras físicas e vocais, em diálogo físico – textual, e objetos e aspectos encontrados na prosa poética de Antonin Artaud, como o caráter híbrido na forma poética, o intimismo, os “múltiplos eus” – “Je est un autre”, a abordagem confessional e autobiográfica de uma criação coletiva na medida exata à duração das cento e cinco horas de trabalho disciplinar.


Corporificação: Imagens no corpo e no espaço

Se nos anos 30 o teatro para Artaud é “o lugar onde se refaz a vida”, depois de Rodez ele é essencialmente o lugar onde se refaz o corpo. O corpo refeito e reorganizado, que uma vez libertado de seus automatismos se abre para “dançar ao inverso”. A questão que se coloca é de permitir que o teatro reencontre sua verdadeira linguagem, linguagem espacial, linguagem do corpo, linguagem de gestos, de atitudes, de expressões, de mímica, linguagem de gritos e linguagem sonora, onde todos os elementos objetivos se transformam em signos, sejam visuais, sejam sonoros, mas que terão tanta importância intelectual e de significados sensíveis quanto a linguagem de palavras.

(...) Mímica de gestos espirituais que escandem, podam, fixam, afastam e subdividem sentimentos, estados de alma, idéias metafísicas. Esse teatro de quintessência onde as coisas realizam estranhas meias voltas antes de voltar à abstração. (ARTAUD,1999:71)

DESPIR-SE DO TEXTO & VESTIR-SE DA AÇÃO FÍSICA

Delimitação do problema com os meios disponíveis à investigação

A mímica, que Artaud tanto admirou no teatro de Bali, aproximava-se da idéia da mímica subjetiva de Decroux, que representa os sentimentos e não histórias ilustrativas. Ainda que Decroux e Artaud se diferenciem na formulação de muitas concepções, quando afirmam suas idéias sobre a ditadura do texto no teatro Europeu, parecem compartilhar do mesmo pensamento em relação à dependência do teatro ao texto escrito. Quando Decroux fala que o ator deve ter o corpo de um ginasta com o pensamento de um poeta, remete-nos, diretamente, ao termo atleta do coração usado por Artaud (1999:151). Apesar do seu Teatro da Crueldade não ser baseado na arte da mímica, Artaud certamente tornou-se uma forte referência posterior para o pensamento da Mímica Contemporânea. Os anos 60 assistiram ao regresso de uma utopia, a da preeminência de uma teatralidade ancorada no corpo e na imaginação do ator. O “teatro de texto” é então suspeito de propagar uma cultura morta e inerte, na linha direta de valores denominados ora literários, ora burgueses. O questionamento radical do teatro de repertório e dos “clássicos” que constituem seu esqueleto tornou suspeito, então, qualquer texto de teatro, mesmo contemporâneo, a tal ponto que os autores vivos conheceram ainda maiores dificuldades para ter suas peças representadas nesse período. São o corpo e suas forças secretas e profundas que devem governar o teatro, pensava-se. O Living Theatre, nos Estados Unidos e depois na Europa, Grotowski na Polônia, e na esteira deles muitos dos partidários da criação coletiva, entregam-se à vertigem da improvisação, apelando por vezes com a ressacralização do teatro, com uma eliminação do texto em favor do gesto, do corpo e do movimento, com um contato direto entre o criador demiurgo e o palco.

“A meu ver, ninguém tem o direito de se dizer autor, ou seja, criador, a não ser aquele a quem cabe lidar diretamente com o palco.” (O Teatro e seu Duplo)
O abandono do texto corresponde, nos anos 60, a posições ideológicas. Na afirmação do corpo contra o texto, ou seja, ação física contra oralidade, (e às vezes também contra toda e qualquer palavra), reencontramos a velha desconfiança para com o intelecto e a nostalgia de um teatro popular desvencilhado do peso das palavras: O Teatro Físico.

“Digo que a cena é um lugar físico e concreto que pede para ser preenchido e que se faça com que ela fale sua linguagem concreta". (O teatro e seu duplo)

A afirmação sugere que pensar e ter consciência de pensar são os grandes substratos de existir. E, como sabemos que Descartes via o ato de pensar como uma atividade separada do corpo, essa afirmação celebra a separação da mente, a “coisa pensante” (res cogitans), do corpo não pensante, que tem extensão e partes mecânicas (res extensa). (DAMÁSIO, 1996:279)

“Digo que essa linguagem concreta, destinada aos sentidos e independente da palavra, deve satisfazer antes de tudo aos sentidos, que há uma poesia para os sentidos assim como há uma poesia para a linguagem e que a linguagem física e concreta à qual me refiro só é verdadeiramente teatral na medida em que os pensamentos que expressa escapam à linguagem falada”.
(O teatro e seu duplo)

Neste pensamento “onde se lê o ator-criador”, é referendar novamente o Teatro Físico. Por presentificar a vida, a mímica é encontrada nas mais diversas áreas. Existe a mímica do artista plástico, do bailarino, do ator tradicional, da vida cotidiana. De fato, onde há vida há mímica.

“A habilidade de Picasso de desenhar um touro dependeu de ele ter achado a essência do touro nele mesmo, que liberou as formas dos gestos em sua mão. Ele fazia mímica. O ato da mímica é literalmente o de corporificar e, portanto, compreender melhor". (Jacques Lecoq)

Os nossos gestos cotidianos e expressões são frutos do ato de corporificação, ou seja, da mímica. Tirem a palavra, o figurino do ator, o palco cênico, o edifício teatral e as coxias, deixem somente o ator e seus movimentos para os quais foi treinado, mesmo assim o teatro continuará: o ator comunicará ao espectador através de seus movimentos, dos seus gestos, da sua mímica; o ator pode organizar, sem a ajuda do edifício teatral, o seu teatro como, onde quiser e considerar adequado, dispondo da própria habilidade. (CHAVES, 2001:64)


DIFERENTES ATORES E DIFERENTES PAPÉIS

O Contexto – Construindo e Analisando o Cenário

Segundo Jerzy Grotowski, o teatro pode ser considerado, para muitos professores de literatura, um lugar para dar vida a um texto, mas não para ele. Para evitar mais uma das inúmeras definições desta arte, ele se pergunta sobre o que é indispensável para que o fenômeno teatral aconteça. Ele diz: Pode o teatro existir sem figurinos e cenário? Sim, pode. Pode existir sem a música acompanhando a trama? Sim. Pode. Pode existir sem efeitos de luz? Sim, pode. E sem o texto? Sim; a história do teatro confirma isto. Na evolução da arte teatral o texto foi um dos últimos elementos a ser adicionado. (...) Mas pode o teatro existir sem o ator? Eu não conheço nenhum exemplo disto. Alguém poderia mencionar o teatro de bonecos. Mesmo neste exemplo, porém, o ator encontra-se atrás da cena, embora seja de outro tipo. Pode o ator existir sem audiência? Pelo menos um espectador é preciso para fazer disto uma performance. Bastam uma pessoa que atravessa um espaço e outra que a observa, e todas as condições estão formadas para o milagre do teatro. Para fazer teatro, para examinar e compreender o teatro precisa-se apenas de uma coisa: a matéria humana. O humano como força maior do ato teatral. O Teatro Físico tem uma trajetória singular dentro do teatro contemporâneo, destacando-se na cena nacional (recente) e internacional (desde sempre), buscando manter um constante de renovação, cercado da expectativa de mais um acontecimento teatral inovador. Certamente precisamos antes de tudo de um teatro que nos desperte: nervos e coração. Tudo o que age é uma crueldade. É a partir dessa idéia de ação levada ao extremo que o teatro deve se renovar. Tudo o que há no amor, no crime, na guerra ou na loucura nos deve ser devolvido pelo teatro, se ele pretende reencontrar sua necessidade.


Problema situado no presente, uso da pesquisa-ação

Na vida, as formas são muito fascinantes, sedutoras. Ao mesmo tempo, quanto mais trabalhamos, mais nos damos conta de que as formas são sempre exteriores. Mesmo a forma mais profunda é exterior. Mesmo se você diz “Deus”, a palavra não é a realidade. A forma é um veículo. As formas mudam. Mesmo as cores, que num momento parecem corretas, algum tempo depois já não parecem a mesma coisa. Cada teoria, cada idéia deve ser testada e redescoberta passo a passo. É precisamente o que faz o teatro: ele pretende alcançar a verdade pela experiência. Cada cultura exprime uma parte diferente de nosso atlas interior: a verdade humana é global, e o teatro é o lugar onde esse quebra-cabeça pode ser reconstituído.
Um texto medíocre pode dar origem a apenas algumas formas, enquanto um grande texto, uma grande partitura de ópera, são verdadeiros nós de energia. Sempre nos surpreendemos pela quantidade de formas inesperadas que podem surgir dos mesmos elementos, e a tendência humana a refutar isso é uma redução do universo. O diretor de teatro precisa de uma única idéia – a qual ele deve buscar na vida, não na arte, fruto de sua interrogação sobre o que um ato teatral acrescenta ao mundo, por que ele existe. O teatro é antes de tudo, vida. É o ponto de partida indispensável, e não há nada mais que possa nos interessar verdadeiramente do que o que faz parte da vida, no sentido mais amplo da palavra. Pouco a pouco, perdi todo o interesse por outra coisa que não seja veiculada pelo ser humano.

Nesse sentido, não é uma pesquisa teórica de uma forma que se chama simplicidade. Se buscarmos a simplicidade, estamos liquidados. Não quero uma forma e para alcançar o que pressentimos ser o essencial, é preciso eliminar muito. Os dois caminhos são “fazer em demasia” ou “não fazer o bastante”. São sempre essas duas mãos. Com uma se faz demais e, com a outra, mostramos: Não, não é necessário. Se tentarmos muito rapidamente eliminar tudo – gestus, ações, movimentos, voz, experimentos, texto, repetições, ajustes, vamos à direção errada; e se fizermos em demasia, ficamos saturados. As formas devem se adaptar: seja em Pina Bausch, Bob Wilson, Zé Celso, La Fura... A forma, mesmo que repetida, é a malha entre um conteúdo e a sociedade imediata. A forma do teatro, talvez, será, mais do que o teatro de rua, o teatro de ruínas, e os dois são possíveis.

Diagnóstico

O limite entre o teatro e o “qualquer coisa” no teatro, é muito simples explicar, sem fazer nenhuma discussão semântica ou filosófica sobre o que quer dizer. Há um pintor na Inglaterra que faz quadros com fezes. Antes, houve um que fazia o mesmo com cocô de elefante. Por trás disso há algo que não se sustenta, sem a necessidade de se justificar o certo ou errado. Quase todo mundo que vê um quadro de Picasso ou de Goya percebe a diferença. O pintor dirá “minha merda é tão brutal e realista quanto esse quadro de Goya”. Intuitivamente, sabe-se que não é verdade. Porque um é “qualquer coisa” e o outro é “alguma coisa”.

Relevância – discreta subversão

Mostra antológica de Lygia Pape, protagonista essencial da arte contemporânea, é mais um exemplo da necessária reavaliação da envergadura do legado estético que, por falta de pesquisa de campo e excesso de teorias, está com sua contribuição artística subdimensionada a quase coadjuvante. Lygia fazia aflorar a saudade de uma presença que imantou a cena artística nacional com seus estudos sobre Gestalt, um dos núcleos teóricos do Concretismo. Muito seguramente, por causa da altivez de quem sabe sobreviver – é um nome pouco estudado, seja só no âmbito da vertente construtiva brasileira – da qual foi inconteste pioneira, seja na influência exercida por sua obra, ao irradiar a carga de subversão que engendra a sua própria imagem na tela – Língua Apunhalada; como o estabelecimento de um novo discurso com a participação do sensorial e do social na obra. A sua contribuição nesse contexto, abre caminhos para a compreensão do espaço do corpo no próprio processo de fazer a obra descarnada em puro movimento. Estamos lidando com uma metáfora, com qualquer coisa ou com uma obra de arte?

* Propositalmente, em idioma japonês, no romper fronteiras e compreenções, independentemente do idioma falado, ou seja, TEATRO FÍSICO.


Referência

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2. UOL: Pina Bausch, a insubmissa
3. CAMUS, Albert: Copeau, seul maître, in Théâtre, Récits, Nouvelles; Paris: Éditions de la Pléiade, 1962; p. 1698
4. Lindsay kemp
5. http://www.scribd.com/doc/6587339/Artaud-Antonin-1938-Theater-of-Cruelty-1st-Manifesto, Theater of Cruelty, 1st Manifesto, (1938)
6. GROTOWSKI, JERZY - Sobre o método das ações físicas (GROTOWSKI, 1995:32)


Bibliografia

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